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Ainda há juízes em Berlim

Olavo Hamilton

Advogado, Doutor em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), Conselheiro Federal da OAB, Professor e Escritor.


A frase “ainda há juízes em Berlim” tornou-se um símbolo poderoso de confiança no sistema de justiça, evocando a ideia de que o poder judiciário pode proteger os direitos dos cidadãos, mesmo diante de governantes autoritários. Essa expressão, de origem alemã, carrega uma história interessante e ressoa até hoje como um lembrete da importância de um sistema judicial independente para combater abusos de poder.




A expressão remonta ao século XVIII, durante o reinado de Frederico II, o Grande, na Prússia. A história gira em torno de um simples moleiro chamado Arnold, cujo moinho ficava próximo a uma das propriedades do rei, o palácio Sanssouci em Postdam, nos arredores de Berlim. Frederico teria se incomodado com o barulho e a estética do moinho e, por isso, exigido que Arnold o vendesse ou o fechasse. Confiante em seus direitos, o moleiro recusou-se, afirmando que o moinho estava ali antes da construção do palácio real. Frederico, então, teria ameaçado confiscar a propriedade, mas Arnold, seguro de que a justiça prevaleceria, respondeu: “Ainda há juízes em Berlim!”.


Essa resposta reflete a crença de Arnold de que o sistema de justiça da Prússia – mesmo que parte do Estado – se manteria imparcial, defendendo o cidadão comum contra o arbítrio do rei. A expressão “ainda há juízes em Berlim” logo se tornou um símbolo da confiança popular de que, por mais que o poder de um governante possa ser vasto, ele não é absoluto; há um limite imposto pelo direito e pela justiça. Rei e peão teriam o mesmo valor e importância diante de um judiciário justo e imparcial, pois o juiz não se encontra no tabuleiro do xadrez.


No contexto atual, essa expressão é especialmente relevante. O papel do poder judiciário como guardião dos direitos fundamentais e dos princípios constitucionais continua a ser essencial. Embora os tempos tenham mudado, ainda há situações em que cidadãos se encontram diante de poderes que, em diferentes escalas, buscam atuar com arbitrariedade ou abuso de autoridade. Nessas horas, o judiciário deve agir como um baluarte de proteção, lembrando-nos de que ninguém está acima da lei.


Esse episódio do moleiro e o rei também nos ensina que a confiança pública no poder judiciário é essencial para uma sociedade democrática e para o fortalecimento dos direitos humanos. Se há confiança de que “ainda há juízes em Berlim” – ou seja, que ainda há juízes justos e independentes –, as pessoas se sentirão seguras ao buscar reparação e proteção de seus direitos, sabendo que serão ouvidas e julgadas com imparcialidade.


A frase serve como um lembrete de que a justiça deve ser acessível e imparcial, funcionando como uma garantia contra toda forma de arbítrio e injustiça. Em tempos de incerteza e abuso de poder, "ainda há juízes em Berlim" ecoa como uma promessa de que a justiça pode, e deve, prevalecer. Em tempo: séculos se passaram e o moinho segue em pé, como se desafiasse a imponência e a beleza de Sanssouci. Que metáfora!

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